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sexta-feira, julho 3

O Bolo e a Governanta 

(No meio de tanta informação sobre a Grécia, Portugal, etc, procurei ver se arranjava uma forma de não perder de vista o que me parece essencial... agradeço sugestões de melhoria...)

Esta alegoria gira em torno de:
Todos querem provar do Bolo de anos. É feito um bolo por ano, com grande esforço de todos. Ele é óptimo e ninguém se farta dele, todos querem sempre mais. Só que assim ele não chega para todos...
Cabe à Governanta dividir o bolo. Ela tem de fazer opções que não vão agradar a todos e tentará dividir o bolo de modo a minimizar o descontentamento, mas haverá sempre insatisfeitos. Se houver muita insatisfação a Governanta é despedida, o que acontece com alguma frequência.
Para evitar o despedimento, a Governanta dispõe de um truque para que todos tenham mais bolo e fiquem mais contentes: vai pedir a uma vizinha uma fatia do bolo dela, prometendo-lhe que mais tarde lhe devolverá uma fatia maior. Parece ser um bom negócio e ele é feito de mútuo acordo: assim distribui-se mais bolo por todos na casa; a vizinha fica temporariamente com menos bolo mas mais tarde terá mais do que o que tinha antes; a Governanta minimiza o descontentamento e conserva o seu emprego.

A história:

                O truque funcionava tão bem que em certas casas as governantas recorriam a ele por tudo e por nada. Como havia muito bolo, todos achavam que a governanta fazia um óptimo trabalho. Passado algum tempo, as vizinhas começaram a pedir as suas fatias de bolo de volta, aumentadas, como combinado. No início a governanta lá foi gerindo a coisa, dando menos bolo a alguns, reduzindo aqui e acolá o que podia, mas às tantas era simplesmente impossível: o que havia para distribuir não chegava para tudo. Havia uma longa fila de vizinhas a bater à porta a exigir o que se tinha combinado; praticamente não havia vizinhas dispostas a emprestar bolo porque achavam que não se iria cumprir o prometido; as poucas que havia exigiam fatias muito maiores porque o risco de não recuperarem bolo nenhum era muito grande...

quinta-feira, fevereiro 6

Filosofia de altifalantes 

Este texto estava aqui perdido há alguns anos como rascunho; parece que não perdeu actualidade...

Quem circula pela zona da Universidade de Coimbra nota nalguns dias, a diversas horas, um fenómeno curioso: um altifalante claramente audível que debita números, geralmente da ordem das centenas, 373, 231, 365, 128, 262,... Demorei algum tempo a perceber que deveria vir do complexo penitenciário que fica logo ali abaixo. Chamam os reclusos (ou deveremos dizer cidadãos privados de liberdade, já que presos parece estar fora de moda) para qualquer coisa e nós, devido a um qualquer processo de reflexão das ondas sonoras, ouvimos esse chamamento, como que a lembrar aqueles que por ali circulam, aparentemente livres, que se devem portar bem, ou, ainda, que a liberdade é um bem tangível. E é interessante notar que, nalguns casos, como o presente, ser chamado por um número até poderá ser uma forma de respeitar a privacidade.

Este fenómeno inopinado prova também que é possível haver altifalantes audíveis. Quem já foi ao médico de família ou a um hospital deve ter notado que há por lá altifalantes que, embora chamem pelos nomes das pessoas, dificilmente se consegue perceber alguma coisa, s...tz...nhor ..Jo...tzz...tz...ão ao gabi...tzz...nete ...tzzz... Será que tudo isto terá algum sentido?

sábado, outubro 20

A vermelho, 6 anos de governação de Sócrates 

Se lhe custa a crer, vá ver com os seus próprios olhos: os dados são do IMF Data Mapper de Outubro de 2012 (escolha o dataset "Historical Public Debt Database" e no mapa escolha "Portugal").   

domingo, julho 10

Exame de Português, Literatura e Vida 

Ao que parece as notas do exame nacional de Português são baixas e uma das explicações é a dificuldade dos estudantes em fazerem uma composição relacionando Literatura e Vida.

Será que, em vez de empaturrar os jovens com coisas como esta, os programas não falam da principal razão da existência da literatura? Será que pouca gente fala aos estudantes do Fernando Pessoa empreendedor falhado com uma personalidade borderline cujos escritos influenciam o pensamento de milhares de pessoas. Das implicações históricas, sociais e políticas do Felizmente há luar, ou dos livros de José Saramago e Eça de Queirós? Da influência destes livros na vida das pessoas que os leram de facto? Da relevância das obras de Flaubert, Tolstoi, Dostoievski, Shakespeare, Goethe e Homero para milhões de seres humanos?

Se não serve para influenciar a vida para que serve a literatura? Não dar a maior importância a essa sua faceta é considerá-la ao nível das palavras cruzadas, escrita de anagramas, dar milho ao pombos no parque, atirar pedras ao rio, ou ver televisão: um passatempo que pode dar muito prazer, mas pouco mais dá. Será que quem é responsável por estas coisas não leu Jorge de Sena ou George Steiner? Será que nunca leram de facto os livros que fazem estudar?

segunda-feira, junho 6

Um céu cheio de nuvens.

domingo, junho 5


sexta-feira, junho 3

No way, Jose 

“Dez anos é muito tempo…” (de uma música de Paulo de Carvalho)

Percebi há 11 anos atrás que não podia confiar em Sócrates. É muito tempo. Nessa altura cheguei à conclusão que devia duvidar sistematicamente de tudo o que Sócrates dissesse. Não consigo explicar em poucas palavras como cheguei a esta conclusão: seria preciso dar muita informação (exemplo) e algo que também descobri naquela altura foi que ninguém tem paciência para ouvir toda a história, por isso nem vou tentar resumir. Desmontar desinformação requer muita informação e ao fim de algum tempo ninguém tem paciência para ouvir mais.

A minha desconfiança não decorre por isso de nenhuma das inúmeras polémicas mais recentes que envolveram Sócrates (Freeport, Face Oculta, etc etc etc etc etc etc etc etc etc etc etc…). Decorre sim de ter visto Sócrates fingir e enganar os portugueses há 11 anos atrás. Fiquei vacinado para sempre.

A hipótese que então formulei, a de que Sócrates não é confiável, tem-se mostrado extremamente robusta ao longo do tempo. Há cerca de 10 ou 11 anos, à luz desta hipótese, fiz para mim mesmo algumas previsões na altura arrojadas mas que se confirmaram: a de que ele chegaria a primeiro-ministro, a de que aguentaria pelo menos duas legislaturas, a de que a sua governação conduziria a um enorme desastre nacional, a de que a única maneira do povo perceber o problema que tinha ali era chegando à beira do abismo (esta última não acertou muito). Há uma previsão arrojada para o futuro que ainda não está posta de parte e da qual sei que se vão rir: a de que o país poderá ainda resvalar para uma espécie de ditadura a médio prazo, se ele se mantiver em posições de topo no governo ou na oposição. É muito improvável, mas não excluo a hipótese. (“Oh, golpe baixo, estão a meter-nos medo para votar para um certo lado“, pareço ouvir. Não, é só a minha opinião. Para mim ele é como o Melanocetus Johnsonii da figura, uma cruz ao fundo do túnel, embora pareça uma luz. Já o disse neste post pouco antes de Sócrates chegar ao poder, em 2005.)

Eu sei que parece inverosímil que quando Sócrates fala com aquela convicção, determinação, coragem, força, carácter, etc etc etc, ele esteja na realidade a fingir, a fazer teatro. Ou que quando se mostra extremamente chocado com a irresponsabilidade da oposição ou com algo que não quer, ele esteja a fingir. É extremamente inverosímil, mas ele é muito bom actor. Já o vi antes, há 11 anos atrás, e aí tinha a certeza que ele estava mesmo a fingir.

Isto não passa da minha opinião, pode estar enviezada ou não. Seja como for, é por isso que neste domingo vou votar “No way, Jose”.

Novas Oportunidades de gastar dinheiro 

Será que era mesmo preciso gastar, por ajuste directo, muitos milhões de euros em campanhas de publicidade do programa Novas Oportunidades?

Será que era mesmo necessário utilizar nessas campanhas dirigentes locais do PS, que assim beneficiam de publicidade grátis para a sua empresa e partido e que por outro lado ajudam a fazer campanha eleitoral pelo seu partido ("Os imigrantes indianos e paquistaneses foram substituídos ontem na rua pelos trabalhadores das empresas do grande magnata do café")?

Será que era mesmo preciso que essas campanhas publicitárias do estado, pagas por todos nós, se confundissem com campanhas eleitorais de partidos e com publicidade a empresas amigas do regime, resultando numa salganhada muito pouco saudável? A bem da transparência e do bom uso dos dinheiros públicos, seria pedir muito que estes agentes tivessem um pouco de contenção no uso de uma mesma imagem em múltiplas campanhas?

O meu voto 

O Luís vota na esquerda
O Filipe Nunes Vicente na CDU
O Eduardo Pitta no PS
A Fátima já votou no PS de Sócrates.

Tudo gente que muito prezo.

Eu, pela primeira vez na vida, no domingo votarei PS. No PS de Mário Soares e de tantos outros, e no de Sócrates, pois claro.

quarta-feira, junho 1

Estacionamento em Coimbra: cenas tristes e actos falhados 

Estas eleições não me interessam absolutamente nada. O neo-rotativismo que nos querem impor gasta muito dinheiro em perfumes, mas cheira mal dos pés. Já as coisas concretas e os problemas que me rodeiam interessam-me muitíssimo. Estarei a ficar um municipalista libertário?

Embora se note um saudável esforço da Câmara de Coimbra para ordenar o estacionamento, nomeadamente na zona de Celas, continua a haver em Coimbra zonas verdadeiramente surrealistas como sejam a dos Hospitais e Polo III da Universidade. Mas não é desta última zona, para qual terá de ser criado uma estratégia e sistema de parques que funcione de forma eficaz, mas sim das pequenas misérias que se vão consentido, as quais acabam por prejudicar toda a gente até os espertos que delas vão beneficiando, que vou falar.

Comecemos pela via em frente ao Parque verde junto à antiga linha da Lousã. Os carros que por ali estacionam para não pagar o parque em frente, cuja mensalidade não é nada de especial, - eu lá vou pagar para trabalhar dizem os espertos, "mas nós temos de pagar para que vocês andem de carro," digo eu - são uma aberração e um perigo. Já várias vezes ia atropelando as pessoas que saiam desses carros, tratando a estrada como se de um passeio se tratasse. Veja-se a fotografia ao lado e a pessoa que se prepara para atravessar. Note-se ainda o sinal circular com um xis vermelho sobre um fundo azul.

Se os carros que estacionam de forma irregular na via acima para poupar uns trocos estão muito mal, passemos agora a outro nível: o comodismo e o abuso inaceitável. Em frente à padaria da moda estão sempre parados grandes carrões dos senhores doutores, os quais não podem fazer umas dezenas de metros a pé. E de novo lá está o tal sinal com o xis vermelho. Na fotografia (tirada já há algum tempo) podemos ver um elemento da polícia municipal do outro lado da rua e, quem sabe, uns doutores a tentar dissuadir a sua acção. Talvez tenham conseguido, não fiquei para ver. Mas a verdade é que todos os dias há ali carros.

E continuando nos carrões. Veja-se este friso junto à parede do Departamento de Física, numa rua apenas para transportes públicos e peões. A fotografia foi tirada logo após uma senhora cega ter ficado presa entre o carro mais à esquerda e uma árvore e ter caído. Aqueles senhores, se tinham alguma autorização deveriam ter segurança no local para evitar tais situações. Se não tinham autorização, deveriam ter sido multados e, sobretudo, se são reincidentes, condenados a trabalho comunitário de apoio a deficientes.

A tolerância zero é, na minha opinião, a melhor forma de acabar com todas estas formas de comodismo e falta de civismo, ao mesmo tempo que se deveria incentivar a utilização dos parques exteriores e dos transportes urbanos. Poder-se-ia, inclusive, declarar, usando cartazes e outras formas de divulgação, essa tolerância zero de forma a que os prevaricadores tivessem a noção clara de que se não foram apanhados foi por terem tido sorte e não que, se foram apanhados, foi por terem tido azar.

Municipalismo libertário? Não queiramos cair na falácia cínica do Banqueiro Anarquista de Fernando Pessoa. A liberdade não pode ser abuso. A liberdade de cada um termina onde começa a dos outros. E os ricos, poderosos e cultos, ao serem já privilegiados por essas condições, têm mais obrigações e não mais direitos.

segunda-feira, maio 30

A escolha do próximo domingo: "blue pill or red pill"? 

"A Matrix está em todo o lado. À nossa volta. Mesmo agora, nesta sala. Vemo-la quando olhamos pela janela ou quando ligamos a televisão. Sentimo-la quando vamos para o trabalho, quando vamos à igreja, quando pagamos os impostos. É o mundo que foi colocado diante dos nossos olhos para que não víssemos a verdade."

"Esta é a tua última chance. Depois não há como voltar. Se tomares a pílula azul, a história acaba e acordarás na tua cama acreditando no que quiseres acreditar. Se tomares a pílula vermelha, ficarás no país das Maravilhas e eu mostrar-te-ei até onde vai a toca do Coelho. Lembra-te, tudo o que te ofereço é a verdade, nada mais."

sábado, maio 28

“Querida, encolhi o pavilhão” 

Depois de usar indianos, paquistaneses, moçambicanos e chineses “pagos” para encher comícios (ver o vídeo), o PS passou a usar… lisboetas. Passei há pouco no pavilhão do OAF (Académica) na Solum em Coimbra, onde foi esta noite o comício do PS, e vi um rodopio de autocarros (vídeo1, vídeo2) a encherem-se de pessoas com bandeiras do PS. Perguntei para onde iam e responderam-me: para Lisboa. Vi 6 a 8 autocarros naquele momento (não tenho a certeza do número porque alguns estavam em movimento em torno do pavilhão).

Pouco antes tinha entrado no pavilhão. Na televisão, onde se falava de um “mar de gente”, o fundo negro por trás das bancadas deixou-me curioso: o que se esconde por detrás daquelas cortinas? A resposta correspondeu ao que eu esperava: mais bancadas, como se pode ver no vídeo abaixo.





Se se marca um comício para um pavilhão que dispõe de bancadas, para quê ter o trabalho de montar e depois desmontar outras bancadas (e cortinas, etc) transportadas em grandes camiões? O contribuinte português tem mesmo de andar a pagar subsídios aos partidos para montarem estas campanhas megalómanas que desperdiçam carradas de dinheiro, só para não parecer demasiado mal na TV a incapacidade de um grande partido encher um pavilhão desportivo de média dimensão?

Não seria mais honesto (e barato!) deixar este aparato artificial e reservar o comício para uma sala de reuniões que se pudesse realmente encher, com gente realmente de Coimbra?

E os socialistas revêem-se nesta palhaçada de aparências?



Adenda, 28/5/2011:
- Jornal de Notícias: "No dia em que teve mais ouvidos para o escutar - a "arruada" em Barcelos, a meio da tarde, foi a mais longa e concorrida até agora, e o comício da noite, em Coimbra, também teve uma enchente"
- Jornal i: "A aparição de Alegre em Coimbra foi bastante aplaudida por um pavilhão cheio de apoiantes."
- Expresso: "Num comício, ontem à noite, em Coimbra, o ex-candidato presidencial fez levantar o pavilhão da Académica por várias vezes."
- Sol: "no 'mini-estádio' montado dentro do Pavilhão da Académica, falando perante mais de mil pessoas." (noutro local lê-se que o "estádio-portátil" tem 700 lugares sentados; 8 autocarros cheios são cerca de 500 pessoas)
- Público: "Dentro do pavilhão, que estava lotado de apoiantes"
- Diário de Notícias: "Num pavilhão cheio (embora diminuído pelo cenário montado pela máquina de campanha)"
Adenda, 29/5/2011:
- SIC: "Foi até ao momento o maior comício dos socialistas nesta campanha; Coimbra dá ao PS o maior comício dos últimos dias"
- TVI24: "o histórico socialista insuflou de energia o Pavilhão da Académica, que esteve lotado"
- As Beiras: "Num pavilhão da Académica/OAF muito bem composto de público – nas hostes socialistas dizia-se mesmo que o comício conimbricense foi, até ao dia de sexta-feira, o melhor da campanha eleitoral"
- Diário de Coimbra: "José Sócrates falava no final do comício socialista que encheu o Pavilhão da Académica"
- como se vê neste vídeo e nestas fotos (agradecimentos aos Blogs "Mocho-III" e "O Rouxinol de Pomares"), há uma zona reservada aos jornalistas, que vêem o comício do lado de dentro. O número de lugares sentados dificilmente chega aos 700 e deixa pouco espaço para lugares em pé. O mesmo esquema foi usado pelo PS no mesmo pavilhão nas legislativas de 2009.
- O pavilhão dispõe de mais de 1500 lugares sentados, que davam e sobravam para sentar confortavelmente todos os presentes, sem gastar um tostão.
Adenda, 31/5/2011:
- RTP: "Um Megacomício em Coimbra" (minuto 10:58); "O maior comício da campanha socialista" (11:48)

sábado, maio 21

Grandes momentos: a aparente naturalidade 



Vivemos cada vez mais soterrados em informação. Quase não temos tempo para ver os títulos das notícias, quanto mais analisarmos em pormenor o texto de uma notícia e… parar para pensar um bocadinho.

Por vezes é preferível analisar com cuidado pouca informação, mas extremamente relevante, do que nos actualizarmos com as toneladas de spam que nos invadem o quotidiano (na qual incluo a publicidade disfarçada de notícias ou simplesmente informação irrelevante).

Esqueçamos assim por uns momentos as inúmeras notícias que nos distraem do que é importante e atentemos neste curto vídeo, que, embora possa não parecer, é verdadeiramente extraordinário. Nele, o nosso ainda ministro das Finanças explica-nos que “o dinheiro acaba em Maio” e diz, com ar de quem nos está a ensinar algo de evidente, o seguinte:


“não é possível um país sistematicamente estar a gastar oito, nove por cento acima daquilo que produz. É esse o aviso que nos estão a dizer. E é isso que está a ser dito aos portugueses: é que, meus amigos, não podem continuar a gastar oito, nove por cento mais do que aquilo que produzem.”.


Isto é evidente, é de La Palisse, qualquer um de nós diria o mesmo. Aliás, há anos que isto tem sido dito um pouco por todo o lado, com o governo a negá-lo sistematicamente até ter sido forçado a desistir de algumas das fontes de despesa que ajudaram a arruinar o país. O que torna este vídeo extraordinário é o facto da frase ser proferida, com toda a naturalidade, pela última pessoa que, juntamente com Sócrates, poderia fazer esta afirmação. É como se a frase não estivesse a ser dita pela pessoa cuja responsabilidade é precisamente zelar pelas contas públicas e controlar os gastos do país! A pessoa que tinha, juntamente com o primeiro-ministro, o acesso à melhor informação sobre o estado das nossas finanças e que por isso melhor podia prever, decidir e agir adequadamente, se o desejasse, sobre a evolução dessas mesmas finanças.

Ao vermos o vídeo, não nos limitamos a interpretar as palavras que nos entram pelos ouvidos: analisamos inconscientemente a pose, os gestos, a entoação e uma miríade de outros sinais do emissor. Neste caso esses sinais indicam tranquilidade e naturalidade e podem induzir o receptor a deixar-se levar por eles, não concluindo que aquela frase está em absoluta contradição com tudo o que antes aquele senhor disse e fez. Aquela naturalidade no falar foi pensada para transmitir segurança às pessoas que ainda acreditam nestes governantes, criando a aparência de que o que é dito é coerente com o que o governo disse antes. A naturalidade do falar ajuda a criar a ideia de que afinal a necessidade de pedir ajuda foi o desenrolar lógico dos acontecimentos que o precederam, nomeadamente da crise política desencadeada pelo chumbo do PEC IV. E assim quem ainda acredita nesta falsa imagem projectada pensa: “não, o descalabro das contas não teve nada a ver com Teixeira dos Santos, que foi apenas o ministro das Finanças, nem com José Sócrates, que foi apenas o primeiro-ministro nos últimos 6 anos. Não, o descalabro deve ser obra do chumbo do PEC IV. Ou talvez se deva a nós próprios (os contribuintes que no final pagam a crise e os abusos dos governantes), que afinal gastámos demais. Ou talvez se deva à irresponsabilidade da oposição, à crise mundial, às malvadas empresas de rating, aos implacáveis credores, aos gananciosos especuladores, à coligação negativa, à crise da dívida soberana ou ao discurso de Cavaco na tomada de posse ou a tudo isto ao mesmo tempo ou só a algumas coisas de cada vez. O que interessa é que não se pense que foi devido a… quem governou Portugal e tomou todas as decisões relevantes para o país ao longo dos últimos 6 anos.

Aquela naturalidade no falar é, toda ela, desfaçatez.

segunda-feira, maio 16

Reconhecer os erros para os corrigir 

É tão simples a receita para vencer esta crise, trata-se de simples bom senso. Reconhecer um erro permite-nos emendá-lo ou evitá-lo no futuro. Não o reconhecer, procurando falhas em tudo o resto, apenas faz com que o erro não seja corrigido. E assim ele eterniza-se e nunca se sai da cepa torta.

Senhores jornalistas, senhores políticos, sempre que estiverem com o nosso primeiro-ministro, perguntem-lhe se ele reconhece erros na sua governação. Se ele tentar fugir à pergunta, não se deixem levar e insistam: houve ou não erros de governação? Se ele voltar a fugir à pergunta, falando de tudo o resto, da crise ou da irresponsabilidade da oposição, voltem a perguntar até ele finalmente responder o que é evidente: sim, houve erros de governação.

E depois, senhores jornalistas e senhores políticos, não se fiquem por aí. Esmiúcem. Se houve erros de governação, quais? Obriguem o primeiro-ministro a dizer quais foram. Um a um. E depois para cada um desses erros, obriguem-no a explicar o que correu mal e como se pode fazer para corrigir ou minorar o erro. E façam com que ele explique porque é que tendo chefiado o governo não o fez. E depois façam-lhe perguntas sobre os erros que ele não for capaz de reconhecer. Sejam exaustivos.

É tão simples. Chegámos aqui porque errámos. Para sairmos daqui precisamos de perceber onde errámos e aprender com os erros. Puro bom senso.


Repare-se neste excerto do debate entre Paulo Portas e José Sócrates (minuto 7:54, os comentários entre parenteses rectos são meus):

Judite de Sousa: Mas não reconhece erros na sua governação que dura há 6 anos? [a pergunta tinha já sido feita ao minuto 7:30 mas não tinha sido respondida]

José Sócrates: Desculpe, o que eu acho é que nestes últimos 3 anos o país enfrenta, tal como todos os países desenvolvidos, uma séria crise internacional, gravíssima. E o governo tem feito o seu melhor para lhe responder. Certamente que quem age pode vir a cometer erros. Mas o governo não pode ser acusado de não ter feito o seu melhor em 2009, e tivemos em 2009 uma recessão que foi inferior às restantes economias europeias, e tivemos em 2010 que fazer um esforço para fazer frente às dívidas soberanas, mas agora digo-lhe uma coisa: o Dr. Paulo Portas que só fala da crise da dívida, perguntemos ao Dr. Paulo Portas então...[e muda de assunto.]


Se fazendo "o seu melhor" este governo conduziu-nos à bancarrota, então estamos conversados, estes governantes não são suficientemente bons. E certamente que quem age pode cometer erros, mas é bom que os reconheça depois! E não basta agir, é preciso agir bem! Por outro lado, é provável que em 2009 a recessão tenha sido menor em Portugal do que em algumas (e não "as restantes") economias europeias por termos andado iludidos demasiado tempo, adiando o inevitável e continuando a gastar demasiado.

Se fosse verdade que este governo é bom e que deu o seu melhor, então a mensagem de Sócrates, especialista em atirar optimismo para os nossos olhos, não podia ser mais negativa e desanimadora: "com um bom governo, que deu o seu melhor, chegámos à bancarrota. Continuem a votar em nós." Mas se fosse verdade que os nossos problemas resultaram da crise internacional e não de um mau governo, como se explica que Portugal será o único país do mundo em recessão em 2012, como também já referi aqui?

Eu tenho esperança que este país mude para melhor. Mas para isso ele não pode continuar na mesma e tem de perceber onde errou.


Adenda 20/5/2011 - Esta notícia de hoje vem mesmo a propósito:
"Crise: ajustamento económico adiado em 2010 explica pedido de ajuda"
"A culpa do pedido forçado de ajuda externa feito por Portugal não é só da crise financeira internacional e da crise da dívida soberana europeia, defende o Banco de Portugal."

terça-feira, maio 10

Já estou como o Morrisey. 

Deixem-me ser um bocadinho lírico. Dedico esta música ao nosso querido PM.



"Margaret on the guillotine"
(Morrisey, 1988 - dedicado a Margaret Thatcher, na altura PM)

The kind people
Have a wonderful dream
Margaret On The Guillotine
Cause people like you
Make me feel so tired
When will you die ?
When will you die ?
When will you die ?
When will you die ?
When will you die ?

And people like you
Make me feel so old inside
Please die

And kind people
Do not shelter this dream
Make it real
Make the dream real
Make the dream real
Make it real
Make the dream real
Make it real.



Adenda, 16/5/2011: (Penso que este disclaimer é desnecessário, mas nunca fiando...) Obviamente ninguém está a falar da morte física, mas sim da morte política. Um rolar de cabeças no PS após as eleições só faria bem ao partido e ao país. Só é pena não nascer do próprio partido...

quinta-feira, abril 28

Parvos não somos 

Está a dar neste momento a quadratura do círculo e o António Costa já repetiu uma série de vezes que quem provocou a crise foi o PSD. A estratégia do PS é repetir isto infinitas vezes até a cassete ficar gravada na cabeça das pessoas.

De cada vez que o fazem estão a chamar parvo ao povo português. Não há pachorra.

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quarta-feira, abril 13

Passeio aleatório pela tolice nacional: (1) finanças e IRS 

Lá juntei todos os papelinhos e uma destas noites iniciei a saga de submeter a declaração de IRS. A coisa começa mal com os códigos que tinham expirado, mas lá se compôs. A seguir foi a aplicação que não funcionava no sistema Linux do meu computador. Provavelmente terá sido desenvolvida por um grupo numeroso de informáticos que que, ó tolice nacional, tiraram um curso informático de Java e Facebook e são chefiados por lideres que nem isso sabem, mas recebem muitos prémios de produtividade que o FMI nem vai notar que existem.

Passo seguinte, retrocesso cultural e informático, ligar com o Windows Vista no computador dos meus filhos. Não correu grande coisa mas lá foi avançando até que só faltavam os números de contribuinte deles. Quanto ao mais novo, que pediu cartão de cidadão há uns dias, eu sabia que tinha de ir à Loja do Cidadão, mas dos outros, que sei terem número de contribuinte, também nada encontrei. Os papéis em que pediram número de contribuinte, em 2008, só falavam de números provisórios. É que, por esse altura, veio o cartão de cidadão e o número ficou perdido até que termine a validade dos seus bilhetes de identidade. Sobre essa tolice muito haveria a dizer, desde o que aconteceu há pouco tempo com os números de eleitor até esta tolice de as pessoas não conseguirem um documento válido com o seu número de contribuinte se não tiverem cartão de cidadão. A equipa numerosa de gente que tal tolice fez foi provavelmente premiada por boas práticas, mas quem nos protege de gente tão eficiente a mudar tudo sem melhorar nada?

A saga continua no dia seguinte na Loja do Cidadão. Disposto a aceitar perder algum do meu tempo, lá fui. Começou mal, o painel com as senhas tinha mais de duas dezenas de siglas, a maior parte delas eu nem sabia que existiam nem para que servirão. E se eu tive dificuldades, imagino como será com as pessoas menos habituadas a coisas daquelas. Enfim, mais uma tolice. Lá consegui encontrar uma que me pareceu adequada, DGCI, e tirei a senha. Sorte! Fui logo chamado. Azar, começou a tolice...

"Bom dia, para o IRS, eu precisava de saber qual o NIF dos meus filhos, não encontro os números em lado nenhum." "São muitos? Precisa de tirar uma senha por cada um." "Como?" "São as ordens que tenho" "Está bem" e fui tirar mais duas senhas. "Trouxe a identificação dos seus filhos?" "Não, só trouxe o pedido de Cartão do meu filho mais novo e tenho aqui a minha identificação. Não percebo para que precisa das identificações!" "É que tem havido fraudes. Tenho ordens..." Nessa altura eu já estava farto e comecei a resmungar sobre o FMI, as fraudes, os chefes, o IRS, etc. "Não? Então quero o Livro Amarelo!" "Está ali na outra secção." Por sorte disse: "Bem, pelo menos pode dar-me o NIF do meu filho mais pequeno, que tenho aqui um papel..." Começa a escarafunchar no computador e passado uns minutos "Mas o seu filho já tem número de contribuinte!" "Sim, eu sei, mas eu precisava de saber os números de contribuinte deles para o IRS!" "Ah! nesse caso posso dar-lhe os números. O senhor tinha-me dito que queria tirar os NIF dos seus filhos... Quais são os nomes e datas de nascimento?" " Não, eu disse-lhe que queria saber os números de contribuinte dos meus filhos" "Mas olhe que eles estão no papel de pedido no canto superior direito..." Não insisti, todo o processo demorou pouco mais de 15 minutos e consegui pagar só 25 cêntimos de parque... Claro que poderia ter estacionado de qualquer maneira como fazem dezenas de outros e nunca são multados, mas, ó tolice, eu tento cumprir as regras. Neste caso até fui recompensado e lá trouxe os números. É preciso dizer que quando pude ver os tais papéis os números continuavam a não estar lá. Que tolice, como poderiam estar lá se mudaram as regras e estamos sempre a esquecer o passado. Ó país de tolos...

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