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sexta-feira, abril 18

Acordo Ortográfico? Hum! 1923 foi um bom ano... 


O convívio com os livros antigos é uma fonte inesgotável de humildade ortográfica. Neles os a-pesar-de convivem alegremente com os hei de e as mãis com as creanças. E podemos recuar a Camões e às suas misturas de termos eruditos com termos populares; parece que na altura já havia inveja, mas a última palavra dos Lusíadas é mesmo enveja. Por tudo isso, tento não me escandalizar com os alunos que escrevem lexívia. Embora, porque isso parece mais do que um problema de ortografia, o faça quando escrevem ter-mos que fazer...

O mais notável delírio ortográfico que conheço é uma terceira edição de 1923 de uma espécie de livro de auto-ajuda da época: A educação da vontade de um tal Julio Payot com tradução de Jaime Cortesão em que todos os guês que se lêem como jês foram mesmo escritos como jês. Veja-se a imagem para encontrar psicolójicos, orijem e intelijente. A ideia até parece lójica não é?

Neste texto não segui a nova ortografia, mas não tenho nada contra ela. Que venha conviver com as novas e as velhas, em especial com a delirante tentativa racionalista de 1923.

terça-feira, abril 1

Química na literatura e artes visuais 


A química, em comparação com a física e a biologia, aparece pouco na literatura moderna. Embora esteja presente em todo o lado na síntese e transformação de quase todos os materiais que nos rodeiam e ainda na análise das composições e detecção de perigos, não aparece ao leigo como uma coisa assim tão espectacular. Falta-lhe buracos negros e viagens no tempo, manipulação genética e resssureição de dinossaurios. Embora, actualmente, com as séries e livros de criminologia, a química seja mais visível, esta aparece na perspectiva técnica da realização dos crimes e sua descoberta, e não como uma forma de criação. Mesmo o Sherloque Holmes de Conan Doyle, personagem quase linear mas com o seu fundo de contradições, praticava a química para fazer novas descobertas no campo da criminologia; não era apenas um utilizador de técnicas químicas.

De facto, a química tem perdido na literatura a sua imagem de ciência de criação, no sentido filosófico, para se tornar uma ciência de criação de problemas concretos e práticos e sua resolução. A tradição alquímica ainda fornece temas, mas estes estão cada vez mais esbatidos. O cientista que se confunde com a sua criação, Frankenstein, ou O estranho caso do Dr Jekyll e Mr Hide, deram lugar à química prática da vida completamante controlada (embora à beira do abismo) do Admirável Mundo Novo de Aldous Huxley. O cientista louco (muitas vezes um químico com a ideia megalómana de dominar o mundo) está em desuso. A loucura hoje em dia é ficcionada nas pequenas acções domésticas ou nas acções aparentemente inocentes do colectivo. Não é o cientista louco que vai destruir o mundo, somos todos nós aqueles que predamos os recursos e vamos sendo alienados pelo conforto moderno. E por aqui os químicos até podem começar a ser os bons; os que descobrem os problema a tempo e apresentam soluções mais verdes.

Numa vertente mais poética e profundamante ligada à filosofia e à procura de verdades profundas sobre nós e sobre o mundo, encontramos por vezes a química e os processos químicos como metáforas e imagem da vida. Por exemplo, As Afinidades Electivas de Goethe ou A Tabela Periódica de Primo Levi. Também os poemas de António Gedeão nos trazem a química para a vida. E não podemos esquecer a obra do químico Isaac Asimov e o singular Tio Tungsténio de Oliver Sacks.

Das ficções, publicadas nos anos 1980, de uma contaminação causada por industriais maus e burros, que despejavam benzeno nos rios na narrativa linear de Robin Cook, ou de um acidente com um produto químico que nunca se sabe o que é, na sociedade alienada de Ruído Branco de Don Dellilo, até ao acidente radioactivo que origina o comentário que é o título de Morrem Mais de Ataque Cardíaco... de Saul Bellow, em 1987, há muitas perspectivas dos problemas humanos que envolvem a química. Mais do que enumerar a aparição da química da literatura e artes visuais, verdadeiramente interessante será compreender as razões e as motivações dessa aparição.

Bibliografia consultada (para além dos livros referidos):

Roslynn Haynes, "The Alchemist in Fiction: The Master Narrative" HYLE 12 (2006) 5.
Peter Weingart, "Chemists and their Craft in Fiction Film" HYLE 12 (2006) 31.
Philip Ball, "Chemistry and Power in Recent American Fiction" HYLE 12 (2006) 45.
Charles A. Lucy, "Analytical Chemistry: A Literary Approach" J. Chem. Educ. 77 (2000) 459.

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