terça-feira, julho 28
A alegoria do cubo mágico
Os que não sabem o que é um cubo mágico (Rubik's Cube), que nunca brincaram com um ou mesmo aqueles que não têm uma ideia de "como se faz" que me perdoem mas não vão compreender na totalidade o que se vai escrever a seguir!
Quem se lembra da primeira vez que pegou num cubo mágico consegue recordar o sentimento de estupefacção e impotência perante o facto das peças se recusarem a alinhar ao nosso gosto. As voltas que se dava sem perceber muito bem por que razão nem uma face éramos capazes de fazer. Mas também não demorava muito até aprender a fazer uma das faces... e depois, eram dias de glória! Fazia-se a vermelha que se desmanchava para fazer a verde, ou a branca ou a azul... faziam-se competições para ver quem conseguia fazer mais rapidamente. Até que aparecia alguém e fazia o cubo todo, as seis faces, ali mesmo à nossa frente, sem truques. A frustração regressava! Alguns de nós aprendemos com ajuda de outros amigos, outros conseguiram sozinhos e muitos, a maioria, simplesmente desistiram...
Fazer o cubo mágico encerra mais ensinamentos do que à partida se possa vislumbrar e é aqui que começa a alegoria.
Não raras vezes me detenho a pensar que o que os intervenientes da nosso mundo político nos oferecem é uma "solução do cubo". Porém, não de todo o cubo mas simplesmente de uma face! Atentando no discurso (principalmente em campanha) o que uns nos dizem é que a face X é que é boa e que todas as outras são péssimas. Às vezes não são tão radicais, e verificamos que nos dizem que a face X deve ter prioridade sobre as outras. A prática também nos tem mostrado exactamente essa realidade: forma-se um governo que sendo estável até consegue completar uma das faces mas que no processo destrói o que estava feito. E se acaso até consegue fazer tal face não sabe o que fazer a seguir sem destruir pois falta-lhe a ideia de conjunto. O típico fado...
E o pior nem sequer é isso! O pior é verificar que muita gente (demasiada) não se preocupa com mais nada a não ser com a sua própria face. O pior é verificar que existem uns senhores que nos vendem a ideia que não é possível ser de outra forma. O pior é verificar que esses senhores realmente acreditam no que dizem e, mercê do poder que detêm, conseguem "silenciar" quem diz o contrário.
Para fazer um cubo é necessário reunir três factores fundamentais: o objectivo, o conhecimento necessário para o executar e a avaliação correcta da fase em que se encontra. Há artistas (fazedores de cubos) que, de tanto saberem, o fazem em menos de 30 s, debaixo de água, com uma só mão e até de olhos vendados. Todos eles comungam do mesmo objectivo e do mesmo conhecimento, podendo variar na forma de o fazer, isto é, no algoritmo que utilizam. Todos eles avaliam o estado do cubo e só depois avançam. E se porventura, um deles deixasse o cubo inacabado para outro continuar, o seguinte além de não destruir o trabalho já feito continuaria para o mesmo objectivo. Desta forma, o objectivo final encontra-se sempre mais próximo de se atingir.
Quão diverso do que me dado a observar no mundo político! Quantos destes senhores saberão que as peças centrais são inamovíveis e que sobre elas se estriba o resto do cubo? Quantos conhecerão os movimentos básicos? Quantos conhecerão um algoritmo que leva à solução? Quantos reconhecerão as diferentes fases que se devem completar? Quantos perceberão a inevitabilidade de se completar uma fase antes de se avançar para outra? Quantos saberão que uma avaliação de tudo antes de começar uma nova fase é uma condição sine qua non?
Não peço uma solução milagrosa (nem acreditaria nela), mas gostaria como cidadão votante, que os discursos encerrassem não apenas uma face mas todas as outras, que indicassem um caminho aproveitando o que existe, e que acima de tudo, indicassem um objectivo claro e inequívoco que nos englobasse a todos!
sábado, julho 25
Bolas
segunda-feira, julho 20
Há 40 anos
domingo, julho 19
Tendências
Como previsto, a temperatura global está a aproximar-se dos máximos de sempre (registos do NOAA), tendo batido mesmo alguns recordes no passado mês de Junho.
quinta-feira, julho 16
Gripe A: quo vadis?
De um modo global, concordo com o que diz o editorial do Público de 15/7/2009: a informação sobre a gripe A tem sido comunicada de uma forma eficiente e sóbria, sem alarmismos exagerados ou grandes falhas. No entanto, é preciso ver que ainda a procissão vai no adro: é cedo para balanços, sobretudo num processo tão dinâmico como este. É fácil cair-se numa rotina de divulgação de informação que leve a que esta seja distribuída sem ser devidamente apreciada nas suas diferentes facetas - pelas autoridades, pelos media, pelo público em geral.
Por exemplo: porque é que ainda não vi ninguém referir que Portugal é um dos países da Europa onde mais rapidamente se está a disseminar a doença (ver tabela abaixo - acima de nós na Europa só mesmo o Chipre e Malta)? No último mês, o nº de casos confirmados em laboratório aumentou em Portugal quase seis vezes mais do que no resto da Europa. Enquanto que em média no mundo o nº de casos duplica a cada 15-20 dias, em Portugal no último mês duplicou a uma velocidade muito maior, a cada 6 dias. Os elevados fluxos de pessoas provenientes de alguns dos principais “reservatórios” da doença (Estados Unidos, México, Canadá, Inglaterra, Espanha) podem ajudar a compreender o fenómeno, mas é difícil tirar grandes conclusões quando apenas se sabe o total de casos ao nível nacional. Por exemplo, como tem evoluído a propagação da gripe no Algarve, onde chegam tantos turistas ingleses?
Ultrapassada a fasquia dos 100 casos em Portugal, não será útil divulgar regularmente um mapa do nº de casos por região, além do total de casos no país? (Este tipo de mapas foi divulgado em Espanha desde o início da propagação, por exemplo.) A prevenção e a detecção de novos casos e a compreensão da evolução da propagação da doença não melhorarão se a informação regional estiver facilmente acessível e actualizada, conduzindo a melhores decisões, quer por parte dos responsáveis técnicos quer por parte do público em geral (sobretudo em época de férias, onde as deslocações aumentam)?
Adenda (17/9/2009):
- "Britain prepares for 65,000 deaths from swine flu" (Times, 17/9/2009)
- "Scenario of 65,000 deaths from swine flu based on simple calculation" (Times, 17/9/2009)
Por exemplo: porque é que ainda não vi ninguém referir que Portugal é um dos países da Europa onde mais rapidamente se está a disseminar a doença (ver tabela abaixo - acima de nós na Europa só mesmo o Chipre e Malta)? No último mês, o nº de casos confirmados em laboratório aumentou em Portugal quase seis vezes mais do que no resto da Europa. Enquanto que em média no mundo o nº de casos duplica a cada 15-20 dias, em Portugal no último mês duplicou a uma velocidade muito maior, a cada 6 dias. Os elevados fluxos de pessoas provenientes de alguns dos principais “reservatórios” da doença (Estados Unidos, México, Canadá, Inglaterra, Espanha) podem ajudar a compreender o fenómeno, mas é difícil tirar grandes conclusões quando apenas se sabe o total de casos ao nível nacional. Por exemplo, como tem evoluído a propagação da gripe no Algarve, onde chegam tantos turistas ingleses?
Ultrapassada a fasquia dos 100 casos em Portugal, não será útil divulgar regularmente um mapa do nº de casos por região, além do total de casos no país? (Este tipo de mapas foi divulgado em Espanha desde o início da propagação, por exemplo.) A prevenção e a detecção de novos casos e a compreensão da evolução da propagação da doença não melhorarão se a informação regional estiver facilmente acessível e actualizada, conduzindo a melhores decisões, quer por parte dos responsáveis técnicos quer por parte do público em geral (sobretudo em época de férias, onde as deslocações aumentam)?
Nº de vezes
Número de casos confirmados que aumentou
15-06-2009 15-07-2009 no último mês
Alemanha 172 763 4,44
Áustria 7 35 5,00
Bélgica 19 124 6,53
Bulgaria 2 17 8,50
Chipre 1 297 297,00
Dinamarca 12 77 6,42
Eslováquia 3 30 10,00
Eslovénia 0 28 ----
Estonia 4 17 4,25
Espanha 488 1099 2,25
Finlândia 4 111 27,75
França 78 464 5,95
Grécia 19 323 17,00
Holanda 61 164 2,69
Hungria 4 26 6,50
Irlanda 12 144 12,00
Islândia 4 7 1,75
Itália 67 224 3,34
Letónia 0 6 ----
Lituânia 0 5 ----
Luxemburgo 2 13 6,50
Malta 0 84 ----
Noruega 13 83 6,38
Polónia 7 35 5,00
Portugal 3 107 35,67
Reino Unido 1320 9718 7,36
República Checa 4 21 5,25
Roménia 16 56 3,50
Suécia 33 200 6,06
Suíça 22 178 8,09
Total 2377 14456 6,08
Fonte: ECDC, via DGS
Adenda (17/9/2009):
- "Britain prepares for 65,000 deaths from swine flu" (Times, 17/9/2009)
- "Scenario of 65,000 deaths from swine flu based on simple calculation" (Times, 17/9/2009)
segunda-feira, julho 13
Os mitos do artificial que é sempre mau e do natural que é sempre bom
Na televisão, vi que a Mónica Lice do Blogue da Minisaia lançou um livro com conselhos de moda e cuidados pessoais. Apanhei mesmo o momento dos champôs com os tais produtos e pensei logo: outra vez o persistente mito urbano do champô cancerígeno sobre o qual já falei aqui...
Mas após ler o texto que escreveu a Mónica em 2006 só posso admirar a sua sensatez. E até digo mais: ajudar as pessoas a serem mais sensatas e menos histéricas em relação às coisas artificiais e naturais é um verdadeiro serviço público. Pois, nem as coisas são más apenas por serem artificiais, nem as coisas naturais deixam de poder fazer mal por serem naturais.
E para aqueles que se obstinam com esta última ideia sugere-se que pensem em coisas naturais como cogumelos ou bagas venenosos, sementes de rícino ou estramónio, raizes de cicuta, minerais de cinábrio e mínio (corantes naturais de mercúrio e chumbo, respectivamente), e outros mimos que a natureza nos oferece.
Mas após ler o texto que escreveu a Mónica em 2006 só posso admirar a sua sensatez. E até digo mais: ajudar as pessoas a serem mais sensatas e menos histéricas em relação às coisas artificiais e naturais é um verdadeiro serviço público. Pois, nem as coisas são más apenas por serem artificiais, nem as coisas naturais deixam de poder fazer mal por serem naturais.
E para aqueles que se obstinam com esta última ideia sugere-se que pensem em coisas naturais como cogumelos ou bagas venenosos, sementes de rícino ou estramónio, raizes de cicuta, minerais de cinábrio e mínio (corantes naturais de mercúrio e chumbo, respectivamente), e outros mimos que a natureza nos oferece.
quinta-feira, julho 9
A tecnologia ao serviço da tolice humana
Os sopradores de lixo e folhas são uma das tecnologias mais estúpidas que conheço. Fazem muito barulho, gastam energia, pesam que se fartam e, além disso, se calhar também contribuem para o aquecimento global (felizmente, por isso, ainda acabarão por ser proibidos). Eu sei que podemos encontrar na internet videos que mostram que os sopradores são mais eficientes do que uma vassoura. Mas, vá lá, uma vassoura é uma tecnologia óptima e um descanso. É leve, podemos repousar quando quisermos encostados a ela aproveitando para poupar energia e, sobretudo, não faz barulho. Uma vassoura é zen, podemos parar para filosofar com o suave barulho das folhas a roçar o chão. Mas quem pode filosofar com aquele barulho do soprador?
O Bill McKibben já tinha escrito mais ou menos o que escrevi há uns bons anos atrás. Quando li o que ele escreveu, não conhecia o objecto, era para mim um significante sem referente. Mas agora que este senhor da fotografia circula diligente, para aí uma vez por semana, debaixo do meu gabinete, perturbando as nossas reuniões e trabalho, não posso deixar de pensar que é preciso ser muito tolo para achar que aquilo é melhor do que uma vassoura...
O Bill McKibben já tinha escrito mais ou menos o que escrevi há uns bons anos atrás. Quando li o que ele escreveu, não conhecia o objecto, era para mim um significante sem referente. Mas agora que este senhor da fotografia circula diligente, para aí uma vez por semana, debaixo do meu gabinete, perturbando as nossas reuniões e trabalho, não posso deixar de pensar que é preciso ser muito tolo para achar que aquilo é melhor do que uma vassoura...
terça-feira, julho 7
Das massas e das massas
domingo, julho 5
Gesticulária e linguagem política dita pouco própria
Na histórias das civilizações que foram de alguma forma, e durante tempos limitados, democráticas, como os gregos ou os romanos, quase sempre os oradores se excederam com gestos e palavras. E foi quando essas civilizações se transformaram em sociedades despóticas que começaram a dar uma importância exagerada ao respeitinho, chegando ao ponto de pretender controlar a vida privada e o pensamento das pessoas.
Nos tempos modernos também, aparentemente, tem sido assim. Com o salazarismo a moralidade é endeusada e todos os que de alguma forma sonham com ditaduras defendem o respeitinho. É nos parlamentos modernos que encontramos a perda do respeitinho, a retórica manhosa, o insulto subtil, mas algo infantil e quase nunca maldoso. E isto é saudável: é com grande certeza um sinal de democracia e convivência democrática.
Infelizmente, tanto nos tempos antigos como nos tempos modernos, também os déspotas, para além de se apropriaram do sistema democrático para se legitimarem, usurparam para si próprios o exclusivo do insulto, que com estes deixa de ser engraçado e passa a ser mais um sinal de opressão. E não deixa apenas de ser engraçado e quase inocente, passa também a ser maldoso.
As fotografias que ilustram este texto são apenas isso: ilustrações do texto. As conclusões a que os leitores chegarem, ou as dúvidas que tenham são da sua inteira responsabilidade e são, quase de certeza, incompletas e incertas.
sábado, julho 4
Pare, SCUT, olhe
Continuo a associar ideias e resistências em paralelo e ponho-me a pensar: se uma auto-estrada sem portagens (uma SCUT, como a A29) tem o poder de retirar tráfego a uma auto-estrada paralela com portagens (como a A1 – ver post anterior), será que também tem o poder de reduzir a utilização do comboio?
Por exemplo, uma viagem Coimbra-Porto-Coimbra fica mais barata se se for de carro ou de comboio?
De comboio, a viagem custa 21€ (Intercidades) ou 30€ (Alfa).
De carro, custa 17€ de gasolina (17 € = 230 km x 1.345 €/litro x 5.5litros/100km no meu carro) mais as portagens, que ficam a 12.9€ se se for sempre pela A1 ou, optando pela SCUT, apenas 8,1€, 6,1€ ou até 0,75€. Suponhamos que pago 6,1€ de portagem e 17€ de gasolina: a viagem fica por 23,1€, o que é praticamente o mesmo que ir de Intercidades e bastante mais barato do que ir de Alfa.
Se o condutor viajar acompanhado, a diferença aumenta dramaticamente:
Ou seja, se uma família de Coimbra for passar o dia ao Porto, o que poupa por usar o carro dá para pagar almoços e jantares e ainda para fazer umas boas compras…
Obviamente que o preço não é o único factor na escolha do meio de transporte, mas com argumentos destes não há costela ecológica que resista... A triste conclusão que tiro é que as SCUT matam por completo o comboio, neste trajecto e provavelmente em muitos outros, e não deveria ser assim.
Por exemplo, uma viagem Coimbra-Porto-Coimbra fica mais barata se se for de carro ou de comboio?
De comboio, a viagem custa 21€ (Intercidades) ou 30€ (Alfa).
De carro, custa 17€ de gasolina (17 € = 230 km x 1.345 €/litro x 5.5litros/100km no meu carro) mais as portagens, que ficam a 12.9€ se se for sempre pela A1 ou, optando pela SCUT, apenas 8,1€, 6,1€ ou até 0,75€. Suponhamos que pago 6,1€ de portagem e 17€ de gasolina: a viagem fica por 23,1€, o que é praticamente o mesmo que ir de Intercidades e bastante mais barato do que ir de Alfa.
Se o condutor viajar acompanhado, a diferença aumenta dramaticamente:
Nº de passageiros: 1 2 ... 5
Carro (SCUT) 23,1€ 23,1€ ... 23,1€
Comboio (IC) 21,0€ 42,0€ ... 105,0€
Comboio (Alfa) 30,0€ 60,0€ ... 150,0€
(o TGV será certamente mais caro do que o Alfa...)
Ou seja, se uma família de Coimbra for passar o dia ao Porto, o que poupa por usar o carro dá para pagar almoços e jantares e ainda para fazer umas boas compras…
Obviamente que o preço não é o único factor na escolha do meio de transporte, mas com argumentos destes não há costela ecológica que resista... A triste conclusão que tiro é que as SCUT matam por completo o comboio, neste trajecto e provavelmente em muitos outros, e não deveria ser assim.