quarta-feira, outubro 8
a carne e a língua
O Jorge do ser português (ter que) comentou de forma bastante engraçada o meu texto sobre os animais e os alimentos na língua portuguesa, congelando-o em dezenas de tipos de neve esquimó. Como aqui no Aba de Heisenberg também não foi muito bem aceite, vou escrever um pouco sobre ele.
Creio que não fui suficientemente claro porque misturei alhos com bugalhos. O meu ponto era apenas a nossa língua e os alimentos. Os ingleses e outros comem beef em vez de cow. Nós temos as vacas no campo a pastar e depois comemos a carne de vaca, não temos outras palavras. Na nossa língua não distinguímos os alimentos obtidos dos animais dos próprios animais. Foi isso que quis dizer com "ter uma língua que é crua e pobre" sobre animais e alimentação. Que isso tenha alguma coisa que ver com "apreciar verdadeiramente a nossa cultura, através do contacto com outras culturas e línguas" foi um exagero que tornou o texto redutor como disseram o Jorge e o Paulo César. Uma treta óbvia como sugeriu a Isabel. Nesse ponto o Jorge, na senda da famosa lista de iogurtes, deu outro rumo, talvez mais interessante, ao meu texto.
O meu objectivo não era comparar a riqueza das línguas. Nós também temos calhau, seixo, burgau, cascalho, pedra, laje, rebo, e sei lá que mais, para as pedras do rio, enquanto que os esquimós não sabem sequer o que isso é! O meu objectivo era comparar, sem grande profundidade é certo, atitudes linguísticas perante os alimentos obtidos a partir de animais.
Fui pouco claro também por causa dos bacalhaus. Bacalhau fresco é coisa que não há em Portugal, e por isso não temos de ter nome para ele. Não deixa, no entanto, de ser interessante suspeitar que talvez ainda haja portugueses que nunca tenham pensado que o bacalhau não é um peixe em forma de gravata. E não vale dizer que outros, ou mesmo alguns de nós, não têm ideia alguma de como é um atum.
E tudo isto vem a propósito (ou talvez não) de toda a infância ter ouvido dizer que "não se deve ter pena do porco que morre na matança, pois ele assim sofre mais". Depois, já adulto, fui confrontado com uma criança que perguntava se a carne do porco era obtida "pedindo aos porcos para eles nos a darem". Entre o não querer pensar no assunto do comedor de carne envergonhado e a alarvidade de quem faz questão de ver no acto de comer carne um comportamento de predador natural, há muitas coisas. Mas a simplicidade desaparecida de quem criava um porco para o matar e meter na salgadeira, fazer enchidos, separar a banha, aproveitando todas as partes, obtendo assim um magro conduto para durar todo o ano, não pode ser esquecida. As palavras que cada povo tem e usa, muitas ou poucas, revelam a sua cultura. No caso presente, a nossa crueza ou simplicidade perante os alimentos obtidos a partir dos animais. É óbvio, mas era só isso.
Creio que não fui suficientemente claro porque misturei alhos com bugalhos. O meu ponto era apenas a nossa língua e os alimentos. Os ingleses e outros comem beef em vez de cow. Nós temos as vacas no campo a pastar e depois comemos a carne de vaca, não temos outras palavras. Na nossa língua não distinguímos os alimentos obtidos dos animais dos próprios animais. Foi isso que quis dizer com "ter uma língua que é crua e pobre" sobre animais e alimentação. Que isso tenha alguma coisa que ver com "apreciar verdadeiramente a nossa cultura, através do contacto com outras culturas e línguas" foi um exagero que tornou o texto redutor como disseram o Jorge e o Paulo César. Uma treta óbvia como sugeriu a Isabel. Nesse ponto o Jorge, na senda da famosa lista de iogurtes, deu outro rumo, talvez mais interessante, ao meu texto.
O meu objectivo não era comparar a riqueza das línguas. Nós também temos calhau, seixo, burgau, cascalho, pedra, laje, rebo, e sei lá que mais, para as pedras do rio, enquanto que os esquimós não sabem sequer o que isso é! O meu objectivo era comparar, sem grande profundidade é certo, atitudes linguísticas perante os alimentos obtidos a partir de animais.
Fui pouco claro também por causa dos bacalhaus. Bacalhau fresco é coisa que não há em Portugal, e por isso não temos de ter nome para ele. Não deixa, no entanto, de ser interessante suspeitar que talvez ainda haja portugueses que nunca tenham pensado que o bacalhau não é um peixe em forma de gravata. E não vale dizer que outros, ou mesmo alguns de nós, não têm ideia alguma de como é um atum.
E tudo isto vem a propósito (ou talvez não) de toda a infância ter ouvido dizer que "não se deve ter pena do porco que morre na matança, pois ele assim sofre mais". Depois, já adulto, fui confrontado com uma criança que perguntava se a carne do porco era obtida "pedindo aos porcos para eles nos a darem". Entre o não querer pensar no assunto do comedor de carne envergonhado e a alarvidade de quem faz questão de ver no acto de comer carne um comportamento de predador natural, há muitas coisas. Mas a simplicidade desaparecida de quem criava um porco para o matar e meter na salgadeira, fazer enchidos, separar a banha, aproveitando todas as partes, obtendo assim um magro conduto para durar todo o ano, não pode ser esquecida. As palavras que cada povo tem e usa, muitas ou poucas, revelam a sua cultura. No caso presente, a nossa crueza ou simplicidade perante os alimentos obtidos a partir dos animais. É óbvio, mas era só isso.
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