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quarta-feira, fevereiro 16

Porque há muito mais coisas entre o céu e a terra 

"Os dados sobre o estado do mundo foram coligidos pela Caritas Italiana no estudo «Os conflitos esquecidos e as guerras sem tempo». A conclusão mais surpreendente – e a mais alarmante – é que, numa guerra, por cada militar que é morto, morrem mais de nove civis. Por outras palavras, mais de 90 por cento das baixas são civis.
O Iraque é um exemplo clamoroso e explosivo deste drama. Segundo a revista médica britânica The Lancet, a «guerra contra o terrorismo» que as forças americanas e aliadas travam em solo iraquiano desde Março de 2003 já matou mais de 100 mil civis. A lista das vítimas mortais entre as tropas invasoras não chega às duas mil. E o país está a tornar-se num amontoado de escombros, onde conseguir sobreviver é quase um milagre. Basta olhar para o que resta de Falluja. Basta recordar o depoimento de um GNR português que, ao regressar há dias de Nassíria, dizia que o que mais lhe custou foi ver as crianças, descalças em pleno Inverno, a pedir qualquer coisa para comer.
Os conflitos armados, além de um rasto de morte e de destruição, deixam feridas invisíveis. O balanço: 11,9 milhões de refugiados, 23,6 milhões de deslocados internos e mais de mil milhões de pessoas com distúrbios psicológicos. E é a mulher quem paga a factura mais pesada. Além de ser usada na guerra, sofre violações e outras formas de violência e humilhação. 83 por cento do tráfico de mulheres e meninas ocorre em zonas de conflito; um quinto das mulheres ruandesas foram violadas durante o genocídio de 1994. Onde se desenha a fronteira entre a guerra e a paz? O terrorismo tornou-se num fenómeno global. Os governos sentem-se vulneráveis e tentam proteger-se fechando as fronteiras e aumentando os gastos com a defesa à custa dos orçamentos para a saúde e educação. A doutrina americana dos ataques preventivos insere-se neste mito da invulnerabilidade. Os resultados estão à vista. Multiplicam-se os cenários de guerra, mas a insegurança aumenta.
Carmen Magallón, directora do Seminario de Investigación para la Paz, de Saragoça, propõe uma abordagem alternativa. Para ela, há que aceitar a vulnerabilidade como inevitável e criar um cenário em que cada vez menos pessoas vejam o terrorismo como a sua opção mais viável. Isto significa ultrapassar «o predomínio da lógica da acumulação económica e de poder que rege as relações internacionais», para optar por uma dinâmica de interdependência e de sustentabilidade da vida. Ou seja, é pelo reconhecimento de que todos dependemos de todos, de que a vida de todos é o valor mais precioso para todos e cada um de nós que passa a verdadeira fronteira da paz."


José Vieira in Além-mar

nota - os sublinhados são meus

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