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segunda-feira, setembro 29

Diário de Lubliana 

Lubliana, 1º dia
Lisboa – Munique – Lubliana

Que me reservarão estes dias? Para começar, um pequeno problema no aeroporto de Lubliana não augura nada de muito bom.

Lubliana, 2º dia
Lubliana é uma cidade primorosa, os eslovenos são bonitos e agradáveis, a organização do curso é fantástica. Aqui não há lugar ao improviso, tudo é bem feito.
Temos um convite para uma recepção na Câmara Municipal. Depois dos discursos, servem-nos sumos. Fico à espera do vinho. Segunda rodada de sumos, não há vinho! Vem a coordenadora do curso explicar que uma lei recente proíbe o álcool em recepções oficiais – para passar a mensagem de que é possível haver festa sem haver álcool. Terão razão, mas que é estranho é!

À noite tenho no hotel um bilhete de outro ABA, estamos os dois em Lubliana.

Lubliana, 3º dia
Não há lixo na rua, nem cocó de cão. Não há casas degradadas (pelo menos à vista) nem mendigos. Não há engarrafamentos nem se dá conta de stress – Lubliana tem só 200 mil habitantes... mas Coimbra ainda menos.... Tudo me é simpático. Entro num centro comercial e oiço Cesária Évora como música de fundo!

Lubliana, 4º dia
Há em Lubliana um monumento de homenagem a Napoleão Bonaparte, o invasor. A vida tem destas coisas: explicam-me que Napoleão, para cativar a população, institucionalizou o Esloveno, que passou a ser ensinado nas escolas, onde até aí só se aprendia alemão. As duas faces da moeda.

Lubliana, 5º dia
Todos os dias a caminho da Universidade, paro no mesmo café, Caffee Trular. Foi escolhido por acaso, é pequeno e tem pouca luz. Dirijo-me ao balcão. Hoje no meu quinto dia em Lubliana já não preciso nem de pedir, o empregado serve-me um magnífico café (Kava) expresso. São estas pequenas coisas que nos fazem sentir em casa.
Ao entardecer, quando a doce noite cai, bebemos vinhos ao pé do Lublianica, o rio e da “ponte tripla” Tromos Tovje. Ao lado, o poeta France Prešeren olha (e)ternamente a sua amada. Do outro lado da rua, Julija, que o trocou por um rico comerciante, está condenada a ficar eternamente à janela. Pelo menos até Prešeren cansar o olhar.

Lubliana, 7º dia
Intolerância! Convidam-nos para um lanche numa quinta nos arredores de Lubliana. Na mesa, posta debaixo de uma enorme tília, colocam pratos com presuntos, queijos e outras delícias, pão e muito vinho. Em torno da mesa estamos portugueses, dinamarqueses, noruegueses, espanhóis, húngaros, eslovenos.... e 3 turcos e 1 paquistanês que prontamente afastam os pratos como se neles morasse o diabo – Não comemos isto! E são eles gente de ciência, que trabalham em instituições científicas de excelência a nível mundial. E eu crente, intolerante e blasfema me pergunto: o que tem Deus a ver com presunto?

Lubliana, 8º dia
Lubliana - Bled –Triglav – Pirano- Lubliana
Lagos, Montanhas, Adriático. Só num país como a Eslovénia é possível ter todas as paisagens num só dia. De manha bebemos a água do Soča em plenos Alpes. O Soča corre dos Alpes num leito do mais puro calcário, o que confere às suas águas geladas uma cor impossível de pedra preciosa. Mais tarde, já no vale, quando as águas engrossam, torna-se de um azul cobalto nunca visto.
Jantamos em Pirano, com o Adriático aos pés: peixe e malvasia!

Lubliana, 10º dia
Em Lubliana há dois nomes omnipresentes: France Prešeren, o poeta nacionalista e Jože Plečnick, o arquitecto. No fim do sec XIX Lubliana foi quase totalmente destruída por um violento terramoto. Coube a Jože Plečnick a reconstrução de boa parte da cidade. Assim, se se pergunta: de quem é esta ponte? Plečnick.
E esta? Plečnick. E estas arcadas? Plečnick. E esta biblioteca? Plečnick. E estas casas? Plečnick!...

Lubliana, 11º dia
Chegou a chuva. E com ela o frio e a vontade de voltar para casa.

Lubliana, 12º dia
Afinal foi só um susto! Hoje o sol voltou brilhante como sempre. Dou uma volta pelo mercado, explosão de cores. Passam grupos de crianças loiras que passeiam acompanhadas pelas professoras – infiltro-me no meio delas e qual parasita tento captar-lhes a alegria. Preciso de calor.

Bienal de Artes Gráficas de Lubliana – no primeiro núcleo sou a única visitante. Embaraço! O que se faz perante uma instalação de livros. Com o nome de instalação já vi de tudo. Perante um vídeo ou de coisas expostas numa parede sei o que fazer: olhar! E perante uma instalação, livros espalhados pelo chão ? O que pretende o autor, o todo ou as partes ? Devo pegar nos livros? E se desinstalo a instalação? E se depois mudo a ordem e instalo a minha própria instalação? Mais tarde, noutro núcleo, reparo que toda a gente mexe nos livros, os abre e os volta a instalar!

Lubliana, 13º dia
Um dos professores da Faculdade pergunta-me de que região de Espanha é o vinho do Porto. Perante o meu espanto, resolve compor o ramalhe, diz-me que sim, que conhece um vinho português, que tem uma garrafa original. Mateus Rosé – of course! Alguém deita a mão a isto?

Luibliana, 14º dia
Ensaiamos poesias nas nossas diversas línguas e depois os mais habilidosos tentam traduzi-los para a língua franca. Do meu colega e amigo Bernardo, catalão, ele próprio um poeta:

Un hombre, sabe que es
hombre
cuando oye su nombre
en los labios de una
mujer.


Antonio Machado

Lubliana, 15º dia
Lubliana – Munique – Lisboa – Coimbra

Finalmente em casa!
Os últimos 15 dias vivi-os num simulador da Torre de Babel: no curso éramos 27 de 11 diferentes nacionalidades. Treinámos conversas em quase todas as línguas, procurámos semelhanças e diferenças nos modos de estar. As semelhanças são cada vez mais e as diferenças esbatem-se a cada dia – pero que las hay, las hay!

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