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sexta-feira, julho 25

Lembram-se do advogado brasileiro que veio dizer que a justiça em Portugal era salazarenta? 

Não sou agente nem parte interessada do sistema judicial, mas, do que me foi dado ver, ler e ouvir nos últimos anos, constato com incredulidade que o nosso sistema judicial parece estar ainda pior do que o do tempo de Salazar. Não considerando os sinistros e discricionários tribunais políticos e os horrendos métodos da polícia política, actualmente a justiça parece ser muito menos transparente e menos célere. Menos justa enfim.

E não se pode dizer falaciosamente que se trata de interesses, ou que se fala disto agora porque é gente famosa. Ainda bem que se trata de famosos para que o problema se torne mais visível. Porque isto parece estar mal há muito tempo. E são muitas as vozes que se ouvem. Algumas há muito tempo, mas só agora parecem estar a ser ouvidas. António Pinto Ribeiro, Garcia Pereira, Mário Soares, Freitas do Amaral, Vital Moreira e tantos outros conhecedores profundos da justiça portuguesa.

Somos o país da Europa com maior percentagem de presos preventivos e a maior percentagem de absolvições desses presos. Os arguidos podem ser presos preventivamente durante meses e até anos sem que sejam julgados. Como se fosse uma condenação antes do julgamento. No tempo de Salazar a prisão preventiva durava no máximo seis meses.

Devido a um exagerado segredo de justiça, que por vezes é quebrado em circunstâncias pouco claras, muitas vezes os arguidos não sabem por que razões são acusados. E, no entanto, podem ser interrogados durante muitas horas seguidas, muitas vezes pela noite adentro. Refira-se que, com o fim da inquisição no princípio do século XIX, tinha acabado o horrível secretismo da acusação que obrigava o arguido a adivinhar os crimes de que era acusado e quem o acusava. Tal parece estar agora de volta numa versão mais suave envolta em nebulosos formalismos e procedimentos processuais.

Por outro lado, creio que é consensual que os juizes deveriam tomar as suas decisões na sala do tribunal com a sua consciência e o seu descernimento, apenas com base na matéria de facto fornecida pelas testemunhas e provas materiais e na matéria de direito que é dirimida por quem patrocina as partes. Actualmente, de acordo com o que tenho ouvido e lido, os juizes que vão julgar os arguidos têm acesso a processos que foram constituídos na ausência de contestação por parte dos advogados destes. Os libelos acusatórios confundem-se com esses processos, podendo ter centenas de páginas. Em muitos casos, demasiadas coisas parecem ser decididas fora da sala de tribunal.

Nos tempos de Salazar a maioria das sentenças era proferida no próprio dia ou quando muito no dia seguinte. Actualmente pode esperar-se meses. Serão toleráveis mais suicídios de presos que esperam as sentenças que os absolvem?

Os tribunais superiores aparentemente não apreciam as provas obtidas na primeira instância, acabando muitas vezes os julgamentos por ter de ser repetidos. Aparentemente privilegia-se o formalismo jurídico em detrimento da apreciação dos factos e dos direitos. Os processos arrastam-se de forma interminável.

Actualmente tudo isto é agravado por um clima de suspeição e descrédito, por teorizações falaciosas e pela inevitável defesa dos interesses instalados. E, para piorar as coisas, ainda temos quem afirme que temos as melhores leis do mundo, quando se tem estado mesmo a ver que não é assim.

As prisões estão cheias de presos ligados à pequena criminalidade e ao tráfico de droga. Há o dilema dos famosos que se são perseguidos é por o serem e se o não são também. A teoria perigosa de que determinados crimes são muito difíceis de provar, deixando em aberto opções arrepiantes. Há os casos mediáticos, que vivendo de especulações e fugas ao segredo de justiça, deixam antever graves violações dos direitos dos cidadãos.

De acordo com a conhecida lei de Murphy o que pode correr mal vai correr pior. Esperemos que não.

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